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Como a previsão de chuvas impacta no preço da energia?

O ano de 2021 foi marcado por secas prolongadas, atingindo a pior crise hídrica dos últimos 90 anos. Esse tema foi recorrente no setor de energia, pois fez com que tanto os preços do mercado cativo quanto do livre aumentassem, além de expor os consumidores ao risco de racionamento. Poucos meses se passaram e, com boas chuvas neste verão, o preço da energia no mercado livre voltou a patamares mais baixos. A relevância do clima no setor elétrico ficou em evidência neste conjunto de eventos.

O preço da energia no Ambiente de Contratação Livre (ACL) é impactado por diversos fatores, sendo o principal deles o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD), que determina os valores de toda a energia elétrica que foi produzida, mas não foi contratada pelos agentes do mercado. Isso significa que, conforme o PLD sofre variações, o preço da energia também é afetado.

O PLD é calculado com base no Custo Marginal de Operação (CMO), que representa o custo para produzir o próximo MWh que o sistema necessita, ou seja, o valor do recurso energético mais caro a ser despachado. A decisão de quais recursos despachar é complexa, pois depende da otimização dos custos operacionais presentes e futuros, buscando o menor valor para a geração de energia e garantindo a segurança energética do sistema.

Em 2021, o Brasil passou pela maior crise hídrica dos últimos 91 anos. A falta de chuva teve impacto direto no preço da energia. Foto: Pixabay

Apesar de surgirem cada vez mais fontes alternativas de energia, a matriz brasileira ainda é majoritariamente hidrotérmica, sendo cerca de 60% da capacidade instalada de geração proveniente de hidrelétricas (custo zero da água, já que depende do regime hidrológico para abastecimento dos reservatórios) e 20% de termoelétricas (custos mais elevados, associado ao combustível). Com isso, o processo de otimização do despacho pode ser simplificado por um esquema usualmente chamado de dilema do operador:

  • Priorizar energia hidrelétrica no momento presente a custos mais baixos reduzindo o volume de água reservado para necessidades futuras é uma decisão acertada, caso ocorram chuvas posteriormente. Entretanto, se ocorrer uma situação de seca, não só termelétricas mais caras podem tem que ser utilizadas, como há risco de déficit de energia.
  • Priorizar a utilização de termelétricas no momento presente a custos mais elevados garante a reserva de água para o futuro. Contudo, se ocorrer um período muito chuvoso posteriormente, há risco de vertimento, que em termos energéticos representa desperdício de água que poderia ter sido utilizada na geração de energia e reduzido os custos. Em contrapartida, caso o futuro seja de seca, a decisão inicial de utilizar termelétricas foi acertada.

Ao analisar o dilema, é notável a relevância da previsão de chuva no preço da energia, considerando que é fonte primária da disponibilidade de água para geração hidrelétrica. Para calcular a solução do problema, o Operador Nacional do Sistema (ONS) utiliza modelos computacionais que otimizam os recursos e demandas de energia no momento presente e futuro.

Além disso, a previsão de vazão (quantidade de água que corre nos rios em um determinado período de tempo) em rios com aproveitamentos hidrelétricos é um dado de entrada nos modelos computacionais e seu cálculo é altamente influenciado pela previsão de precipitação. A princípio, pode não parecer muito relevante, pois existem diversas variáveis consideradas nos modelos que impactam no PLD – existem estudos que indicam que o principal fator responsável pela volatilidade do PLD é a previsão de vazão e essa volatilidade é causada pela considerável flutuação na previsão de precipitação.

Apesar da natureza caótica da previsão meteorológica e sua responsabilidade na volatilidade do preço da energia no mercado livre, sua utilização permite um melhor planejamento e utilização dos recursos hídricos do país. Estratégias de aversão a risco com alto conhecimento técnico sobre essa variável permitem a utilização da meteorologia com eficácia, gerando decisões acertadas no Ambiente de Contratação Livre.